terça-feira, 28 de julho de 2015
Edifício da agência Standard & Poor's em Nova York, nos Estados Unidos. 05/02/2013
REUTERS/Brendan McDermid
Por Walter Brandimarte
SÃO PAULO (Reuters) - A agência de classificação risco Standard & Poor's alertou nesta terça-feira que o Brasil pode perder o grau de investimento devido a riscos políticos e econômicos, em mais um revés para os esforços do governo da presidente Dilma Rousseff de reconquistar a confiança de investidores.
A S&P manteve a classificação de crédito do Brasil de longo prazo em moeda estrangeira em "BBB-", o nível mais baixo do grau de investimento, mas piorou de "estável" para "negativa" a perspectiva da nota, sinalizando que um rebaixamento é possível em 12 a 18 meses.
Segundo a S&P, as investigações de corrupção em curso, que envolvem empresas e políticos no âmbito da operação Lava Jato, têm um peso cada vez maior nas perspectivas fiscais e econômicas. Na visão da agência, aumentou a chance de "novo deslize" na execução do plano de ajuste fiscal liderado pelos ministros Joaquim Levy (Fazenda) e Nelson Barbosa (Planejamento).
Embora algumas autoridades do governo já temessem possível piora de rating ou de sua perspectiva por agências de risco, poucos viam uma revisão pela S&P tão cedo. "Isso pegou o time de surpresa", disse uma fonte do Ministério da Fazenda, falando sob condição de anonimato.
Por outro lado, alguns viram na notícia uma oportunidade de maior munição para o Palácio do Planalto nas negociações com o Congresso para aprovação de medidas importantes para o ajuste fiscal. "O governo pode usar isso para pressionar o Congresso a acelerar a aprovação de medidas de austeridade e de projetos que aumentem a receita", disse um importante parlamentar da base aliada.
No mercado financeiro, o dólar acelerou a valorização contra o real, os juros futuros ampliaram a alta e a Bovespa perdeu força após a mudança da perspectiva do rating brasileiro pela S&P. O movimento, porém, teve curta duração.
"Não há nada de surpresa, já era esperado um movimento desse sem tirar o grau de investimento. O ajuste das perspectivas de agências já estava na conta", afirmou o economista-chefe do Banco Fator, José Francisco Gonçalves.
Para o economista-chefe do banco J.Safra, Carlos Kawall, as agências Moody’s e Fitch --que atribuem rating ao Brasil no segundo degrau da escala de grau de investimento-- devem cortar a nota do país e colocá-la em perspectiva negativa em breve "Todas chegarão no mesmo nível que a S&P está. Temos seis meses. Se não houver sinalização clara para reverter essa deterioração, podemos ver no início do ano que vem a perda do grau de investimento", afirmou Kawall.
Em teleconferência, a analista da S&P Lisa Schineller disse que "embora estejamos assumindo uma situação fiscal mais fraca, também estamos assumindo que ela melhorará e que o Brasil evitará um rebaixamento do rating". Ela citou o exemplo da Índia, que teve a perspectiva para seu rating "BBB-" colocada em "negativa" e foi capaz de evitar um rebaixamento.
FRAQUEZA ECONÔMICA E FISCAL
Há menos de uma semana, o governo reduziu drasticamente suas metas de superávit primário --a economia feita para o pagamento de juros da dívida--, diante de arrecadação bastante aquém do previsto devido à fraqueza da atividade.
"Uma falha no avanço dos ajustes nas políticas fiscais dentro e fora do orçamento poderia resultar em uma erosão maior do que o esperado no perfil financeiro do Brasil e em mais um impacto na confiança e nas perspectivas de crescimento, o que poderia levar ao rebaixamento", disse a S&P.
Ao reduzir as metas fiscais, o governo também traçou uma trajetória pra a dívida pública do país que não convenceu o mercado e especialistas de modo geral. Passou a prever que a relação dívida bruta/PIB --importante indicador monitorado pelas agências de classificação de risco-- fechará este ano a 64,7 por cento, indo a 66,4 por cento em 2016 e 66,3 por cento em 2017. Para 2018, a vê em 65,6 por cento.
O Brasil caminha para ter em 2015 seu pior desempenho econômico em 25 anos, com retração de 1,76 por cento, segundo o mais recente boletim Focus, do Banco Central. A inflação deve superar os 9 por cento, ao menos o dobro da meta do governo de 4,5 por cento, mesmo com o juro básico no maior patamar em vários anos.
Pela manhã, antes de a S&P comunicar sua decisão, Levy participou de evento onde defendeu seu cenário sobre a dívida pública no país, reforçando a necessidade de priorizar as despesas e o diálogo com o Congresso. Na véspera, Levy havia marcado uma entrevista coletiva para esta tarde, após outro evento, mas em cima da hora cancelou sem explicações. Uma fonte do governo afirmou à Reuters que Levy teria dito à sua equipe que a ação da S&P é alerta e poderia aumentar o senso de urgência do Congresso para aprovar as medidas.
O ministro do Planejamento, Nelson Barbosa, disse que o governo está trabalhando para melhorar as condições da economia e que isso deve gerar efeitos.
"Estamos trabalhando para melhorar a situação econômica em todos os seus aspectos, controle da inflação, reequilíbrio fiscal e principalmente recuperar o crescimento. Estamos confiantes que isso vai gerar efeitos no futuro próximo e manteremos a avaliação de risco em situação favorável", comentou o ministro após ser questionado sobre a piora na perspectiva do rating do Brasil pela S&P.
A S&P informou ainda que os ratings poderiam "se estabilizar se o atual elevado nível de incerteza política diminuísse e as condições para uma execução de políticas consistente --nas várias instâncias do governo para estancar a deterioração fiscal-- melhorassem".
"É nossa opinião que tais melhoras dariam suporte a uma virada mais rápida e poderiam ajudar o Brasil a sair de sua atual recessão, facilitando um resultado fiscal melhor e oferecendo um espaço de manobra maior diante de choques econômicos, consistente com um rating nas faixas mais baixas do grau de investimento", acrescentou a S&P.
(Reportagem adicional de Flavia Bohone e Bruno Federowski)
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