Revolução Pernambucana de 1817
A Revolução Pernambucana, também conhecida como Revolução dos Padres, foi um movimento emancipacionista que eclodiu em 6 de março de 1817 na então Capitania de Pernambuco, no Brasil.
Dentre as suas causas, destacam-se a influência das ideias iluministas propagadas pelas sociedades maçônicas, o absolutismo monárquico português e os enormes gastos da Família Real e seu séquito recém-chegados ao Brasil — o Governo de Pernambuco era obrigado a enviar para o Rio de Janeiro grandes somas de dinheiro para custear salários, comidas, roupas e festas da Corte, o que dificultava o enfrentamento de problemas locais (como a seca ocorrida em 1816) e ocasionava o atraso no pagamento dos soldados, gerando grande descontentamento no povo pernambucano e brasileiro.
Foi o único movimento separatista do período colonial que ultrapassou a fase conspiratória e atingiu o processo revolucionário de tomada do poder.
Contou com relativo apoio internacional: os Estados Unidos, que dois anos antes tinham instalado no Recife o seu primeiro Consulado no Brasil e no Hemisfério Sul devido às relações comerciais com Pernambuco, se mostraram favoráveis à revolução, bem como os ex-oficiais de Napoleão Bonaparte que pretendiam resgatar o seu líder do cativeiro em Santa Helena, levá-lo a Pernambuco e depois a Nova Orleans.
Antecedentes
No começo do século XIX, Pernambuco era a capitania mais rica do Brasil Colônia.[6] Recife e Olinda, as duas maiores urbes pernambucanas, tinham juntas cerca de 40 mil habitantes (o Rio de Janeiro, capital da colônia, possuía 60 mil habitantes). O porto do Recife escoava grande parte da produção de açúcar — das centenas de engenhos da Zona da Mata, cujo litoral se estendia da foz do rio São Francisco até a vila de Goiana —, e de algodão. Além de sua importância econômica e política, os pernambucanos tinham participado de diversas lutas libertárias. A primeira e mais importante tinha sido a Insurreição Pernambucana, em 1645. Depois, na Guerra dos Mascates, foi aventada a possibilidade de proclamar a independência de Olinda.
A cidade do Recife meio século após a Revolução Pernambucana.
As ideias liberais que entravam no Brasil junto com os viajantes estrangeiros e por meio de livros e de outras publicações, incentivavam o sentimento de revolta entre a elite pernambucana, que participava ativamente, desde o fim do século XVIII, de sociedades secretas, como as lojas maçônicas. Em Pernambuco as principais foram o Areópago de Itambé, a Patriotismo, a Restauração, a Pernambuco do Oriente e a Pernambuco do Ocidente, que serviam como locais de discussão e difusão das "infames ideias francesas". Nas sociedades secretas, reuniam-se intelectuais religiosos e militares, para elaborar planos para a revolução.
A fundação do Seminário de Olinda, filiado a ideias iluministas, deve ser levada em consideração. Não é por outro motivo que o levante ficaria conhecido como "revolução dos padres", dada a participação do clero católico. Frei Caneca tornar-se-ia um símbolo disso.
Causas imediatas
A bandeira da Revolução Pernambucana de 1817 (imagem) inspirou a atual bandeira de Pernambuco. As três estrelas representam Pernambuco, Paraíba e Rio Grande do Norte, e outras estrelas seriam inseridas ao passo que outras capitanias do Brasil aderissem oficialmente à confederação.
Presença maciça de portugueses na liderança do governo e na administração pública;
Criação de novos impostos por Dom João VI provocando a insatisfação da população pernambucana. Segundo escritor inglês então residente no Recife, era grande a insatisfação local ante a obrigatoriedade de se pagarem impostos para a manutenção da iluminação pública do Rio de Janeiro, enquanto no Recife era praticamente inexistente a dita iluminação;
Grande seca que havia atingido a região em 1816 acentuando a fome e a miséria e ocasionando uma queda na produção do açúcar e do algodão, produtos que eram a base da economia de Pernambuco e que começaram a sofrer concorrência do algodão nos Estados Unidos e do açúcar na Jamaica;
Influências externas com a divulgação das ideias liberais e iluministas, que estimularam as camadas populares de Pernambuco na organização do movimento de 1817;
A crescente pressão dos abolicionistas da Europa que vinha criando restrições gradativas ao tráfico de escravos, mão de obra que se tornava cada vez mais cara e que era o motor de toda a economia agrária pernambucana,
O movimento queria a Independência de Pernambuco sob um regime republicano.
O decorrer da revolução
A revolução iniciou-se com a ocupação do Recife, em 6 de março de 1817. No regimento de artilharia, o capitão José de Barros Lima, conhecido como "Leão Coroado", reagiu à voz de prisão e matou a golpes de espada o comandante Barbosa de Castro. Depois, na companhia de outros militares rebelados, tomou o quartel e ergueu trincheiras nas ruas vizinhas para impedir o avanço das tropas monarquistas. O governador Caetano Pinto de Miranda Montenegro refugiou-se no Forte do Brum, mas, cercado, acabou se rendendo.
O movimento foi liderado por Domingos José Martins, com o apoio dos religiosos Padre João Ribeiro, Padre Miguelinho, Padre Roma, Vigário Tenório, Frei Caneca e mais Antônio Carlos de Andrada e Silva (irmão de José Bonifácio), José de Barros Lima, Domingos Teotônio Jorge Martins Pessoa, Manuel Correa de Araújo, Cruz Cabugá, José Luiz de Mendonça e Gervásio Pires, entre outros. Tendo conseguido dominar o Governo de Pernambuco, se apossaram do tesouro, instalaram um governo provisório e proclamaram a República.
Em 29 de março foi convocada uma assembleia constituinte, com representantes eleitos em todas as comarcas. Nela, foi estabelecida a separação entre os poderes Legislativo, Executivo e Judiciário; o catolicismo foi mantido como religião oficial — porém com liberdade de culto —; foi proclamada a liberdade de imprensa (uma grande novidade no Brasil); e foram abolidos alguns impostos. A escravidão, entretanto, foi mantida.
Luís do Rego Barreto, o algoz da Revolução Pernambucana.
Em punição pelo movimento, diversos revoltosos foram enforcados, arcabuzados e esquartejados, e a então Comarca das Alagoas (imagem), importante região açucareira, foi desmembrada de Pernambuco.
À medida que o calor das discussões e a revolta contra a opressão portuguesa aumentavam, crescia, também, o sentimento de patriotismo dos pernambucanos, ao ponto de passarem a usar nas missas a aguardente (em lugar do vinho) e a hóstia feita de mandioca (em lugar do trigo), como forma de marcar a sua identidade.
Expansão
As tentativas de obter apoio das capitanias vizinhas fracassaram. Na Bahia, o emissário da revolução, José Inácio Ribeiro de Abreu e Lima, o Padre Roma, foi preso ao desembarcar e imediatamente fuzilado por ordem do governador, o conde dos Arcos. No Rio Grande do Norte, o movimento conseguiu a adesão do proprietário de um grande engenho de açúcar, André de Albuquerque Maranhão, que depois de prender o governador, José Inácio Borges, ocupou Natal e formou uma junta governativa, porém não despertou o interesse da população e foi tirado do poder em poucos dias. O jornalista Hipólito José da Costa foi convidado para o cargo de ministro plenipotenciário da nova república em Londres, mas recusou.
A tranquilidade da futura Vila Imperial dos Patos (atual cidade de Patos) foi quebrada pela efervescência da Revolução Pernambucana, que culminaria no movimento denominado Confederação do Equador. O vigário de Pombal, José Ferreira Nobre, assumiu a função de propagá-la em todo o Sertão da Paraíba. Como único caminho que ligava o interior ao mundo civilizado, Patos também se tornou rota dos revolucionários.
No Ceará, Bárbara de Alencar, pernambucana radicada no Cariri, e seu filho, Tristão Gonçalves, aderiram ao movimento, mas foram detidos pelo Capitão-mor do Crato, José Pereira Filgueiras, por ordem do governador cearense Manuel Inácio de Sampaio e Pina Freire. José Pereira Filgueiras participou mais tarde da luta pela Independência do Brasil no Maranhão e da Confederação do Equador, quando se uniu a Tristão Gonçalves contra o governo imperial, sendo considerado um de seus heróis.
Repressão
A repressão ao movimento foi sangrenta. Tropas portuguesas chefiadas por Luís do Rego Barreto avançaram pelo sertão de Pernambuco a partir do território baiano, enquanto uma força naval despachada do Rio de Janeiro bloqueou o porto do Recife. Em poucos dias 8 mil homens cercavam a capitania. No interior, a batalha decisiva foi travada na localidade de Ipojuca. Derrotados, os revolucionários tiveram de recuar em direção ao Recife. Em 19 de maio as tropas entraram na cidade e a encontraram abandonada e sem defesa. O governo provisório, isolado, se rendeu no dia seguinte.
Nove réus foram enforcados e quatro foram arcabuzados. Muitos deles tiveram seus corpos mutilados depois de mortos. O Padre João Ribeiro suicidou-se, mas o seu corpo foi desenterrado, esquartejado e sua cabeça exposta em praça pública. Um episódio que emocionou até os carrascos foi o de Vigário Tenório, que foi enforcado e decepado, teve as suas mãos cortadas e o corpo arrastado pelas ruas do Recife. Outras dezenas de revoltosos morreram na prisão.
Também em retaliação, foi desmembrada de Pernambuco, com sanção de João VI de Portugal, a Comarca das Alagoas, cujos proprietários rurais haviam se mantido fiéis à Coroa, e como recompensa, puderam formar uma capitania autônoma.
Apesar de os revolucionários terem ficado no poder menos de três meses, conseguiram abalar a confiança na construção do império americano sonhado por Dom João VI. A coroa nunca mais estaria segura de que seus súditos eram imunes à contaminação das ideias responsáveis pela subversão da antiga ordem na Europa.
IMAGENS
Domingos José Martins, líder da Revolução Pernambucana, foi um dos treze revoltosos executados pelo crime de lesa-majestade.
O Padre João Ribeiro, líder moral do movimento, suicidou-se, mas o seu corpo foi desenterrado, esquartejado e sua cabeça exposta em praça pública.
Frei Caneca, que esteve no cárcere por quatro anos, foi fuzilado anos mais tarde, por ter liderado a Confederação do Equador.
Antônio Carlos Ribeiro de Andrada Machado e Silva, irmão de José Bonifácio, passou quatro anos na prisão pelo seu envolvimento na Revolução Pernambucana.
Bárbara de Alencar, primeira presa política do Brasil, é considerada uma heroína do movimento.
Auxílio externo
Em maio de 1817, Antônio Gonçalves da Cruz, o Cruz Cabugá, desembarcou na Filadélfia (Estados Unidos) com 800 mil dólares (atualizado ao câmbio de 2007 em aproximadamente 12 milhões de dólares) na bagagem com três missões:
Comprar armas para combater as tropas de Dom João VI;
Convencer o governo americano a apoiar a criação de uma república independente no Nordeste brasileiro;
Recrutar alguns antigos revolucionários franceses exilados em território americano para, com a ajuda deles, libertar Napoleão Bonaparte, exilado na Ilha de Santa Helena, que seria transportado ao Recife.
Grupo de esculturas representando Os Revolucionários Pernambucanos de 1817 na lateral direita do Monumento à Independência do Brasil, em São Paulo.
Porém na data de chegada do emissário aos Estados Unidos, os revolucionários pernambucanos já estavam sitiados pelas tropas monarquistas portuguesas e próximas da rendição. Quando chegaram ao Brasil os quatro veteranos de Napoleão recrutados conde Pontelécoulant, coronel Latapie, ordenança Artong e soldado Roulet, muito depois de terminada a revolução, foram presos antes de desembarcar.
Em relação ao governo americano, Cruz Cabugá chegou a se encontrar com o secretário de Estado, Richard Rush, mas somente conseguiu o compromisso de que, enquanto durasse a rebelião, os Estados Unidos autorizariam a entrada de navios pernambucanos em águas americanas e que também aceitariam dar asilo ou abrigo a eventuais refugiados, em caso de fracasso do movimento.
Data Magna
Em 2007, o dia 6 de março foi declarado a Data Magna de Pernambuco, em virtude da Revolução Pernambucana
Em 2009, o Governo de Pernambuco aprovou outra lei, alterando a Data Magna do Estado para o primeiro domingo de março.
Em 2017, por ocasião do bicentenário da Revolução Pernambucana, o Governo de Pernambuco aprovou uma nova lei, alterando novamente a Data Magna do Estado para 6 de março e reinstituindo assim o dia como feriado civil.
200 anos da Revolução Pernambucana de 1817
No dia 9 de março, às 17 horas, na sala Calouste Gulbenkian, na Fundaj/Casa Forte, as fundações Joaquim Nabuco e Astrojildo Pereira e o Centro Josué de Castro promoveram a mesa redonda “1817 A Contestação da Ordem Monárquica”, em comemoração aos 200 anos da Revolução Pernambucana de 1817. O evento foi aberto com palavras do presidente da Fundação, Luiz Otávio de Melo Cavalcanti e do senador Cristovam Buarque, do PPS, partido ao qual a Fundação Astrojildo Pereira é ligada.
Os palestrantes foram a historiadora e professora da UFPE, Socorro Ferraz, que abordou o tema “Os Contos Loucos e as Fantásticas Carrancas”, o professor Flávio Cabral, que discorreu sobre “A Missão Cabugá nos EUA: uma Página da Revolução Pernambucana” e o arquiteto e professor da UFPE, José Luiz Mota Menezes, que enfocou o assunto: “Um Campo do Erário Régio, Dois Pátios e uma Revolução Republicana”.
Veja Aqui a fala de abertura do evento, feita pelo presidente da Fundaj, Luiz Otávio de Melo Cavalcanti.
História
No dia 6 de março, Pernambuco comemora 200 anos da deflagração da Revolução Pernambucana, uma revolta influenciada pelas ideias iluministas da França e da América contra o Governo Português, naquele momento instalado no Rio de Janeiro.
Embora a capitania de Pernambuco fosse, naquele início do século XIX, umas das mais prósperas economias do Brasil, centro produtor e exportador de açúcar e algodão, a capital do reino de Portugal foi transferida para o Rio de Janeiro, por ocasião das guerras napoleônicas.
Para financiar os elevados gastos da Coroa Portuguesa, o monarca passou a cobrar pesados impostos que atingiam, principalmente, a economia de Pernambuco. A natural insatisfação com o Governo Português, ampliada com a cobrança de novos impostos, alimentou e fortaleceu o ambiente intelectual, político e econômico que germinava no Recife e em Olinda, propício à descolonização.
A revolução foi liderada por destacados membros da maçonaria, como o comerciante Domingos José Martins, por militares, como José de Barros Lima, conhecido como o Leão Coroado, Pedro da Silva Pedroso e vários religiosos, Muniz Tavares, João Ribeiro, Padre Roma e Padre Miguelinho.
O governo provisório instalado declarou independência de Portugal e proclamou a república; decretou liberdade religiosa e de imprensa, mas não alterou as relações de trabalho escrevo dominantes na produção canavieira.
A República de Pernambuco resistiu por mais de dois meses à ofensiva de D.João VI que enviou cerca de 8 mil homens e uma frota naval para bloquear o porto do Recife, conseguindo esmagar o movimento republicano no dia 19 de maio.
O historiador Carlos Guilherme Mota considera a Revolução Pernambucana de 1817 como o maior movimento de contestação à ordem monárquica até então ocorrido no mundo afro-luso-brasileiro, abrangendo todo o Nordeste brasileiro.